A meio da manhã o ambiente é
pacato no Mercado Municipal D. Pedro V, até as horas mais movimentadas têm
agora poucos fregueses, mas o mercado
mantém o seu encanto, com os mais diversos produtos, uma mistura de
cheiros, bancas verdejantes, flores coloridas, pastelarias com bolos
chamativos, talhos que se alinham uns a seguir aos outros, lojas de roupa e
retrosarias, sapatarias, uma loja de cestas, outra de decoração… Aqui há de tudo!
Entrando pela porta do lado do
Elevador do Mercado, somos recebidos pelas floristas, que aguardam à porta. Depois
o cheiro a peixe dá-nos as boas-vindas. Atrás das bancas cheias de carapau,
sardinha, pargo, salmão, os vendedores esperam pela clientela que escasseia,
olham expectantes para cada cliente ou turista que por ali passa.
Numa das bancas encontrámos a já
terceira geração a ocupar aquele lugar: Pedro Fernandes, 34 anos, conta-nos “Trabalho
aqui há cinco meses, isto é do meu pai. Eu já cresci aqui. Já era da avó e passou para o pai e agora estou cá eu!”. Mas o
dia-a-dia dele e dos colegas das bancas de peixe que o rodeiam, não é fácil, e
as horas parecem não chegar: “ Vamos à
lota todos os dias buscar peixe fresco. Tanto podemos ir à Figueira, como a
Aveiro… durante a noite… temos de fazer esses sacrifícios…” e às seis e pouco
da manhã já estão a descarregar a mercadoria e a montar a banca do mercado, e
depois é esperar que alguém compre.
No meio de frutas, legumes e
hortaliças, Dona Maria, de 58 anos, revela-nos que nem sempre os vendedores
tiveram a sua banca reservada. Antes da reconstrução do mercado em 2001 “também
tínhamos a banca numerada e o lugar fixo” mas, “Antigamente não, corria-se e
era uma confusão desgraçada”. E já lá vão “ 40 e tantos, 44 p’ra aí!“ que Maria
anda pelo mercado de Coimbra, vendendo hortaliças, e há mais ainda anda Leonor
da Conceição, que nos chamou a perguntar se queríamos comprar tomate, diz com
melancolia e olhando para trás “ó
filha, nem à escola fui! Desde pequena, desde pequenina…andar nas terras e
trazer para aqui. É tudo cultivado por mim!", e a vida continua dura, para esta senhora
de olhos doces e rosto cansado, continua atrás da banca do mercado, semana após
semana “eu já tenho 75 anos, venho porque as reformas são muito fracas…”. E
porque o mercado sempre foi a sua vida e nunca foi à escola, não pôde tirar a
carta, e com carinho conta que o seu marido, a quem chama “meu amor”, está doente:
“ conduzir para aqui ainda tem sido o meu homem, que eu nem sei ler nem tenho
carta… mas nas terras tenho de ser eu sozinha”.
O mercado está envelhecido, maioria dos vendedores são da
terceira idade, continuam a trabalhar porque as reformas são pequenas ou porque
o fizeram toda a vida: cultivar e vender. Os jovens também não compram no
mercado, vão aos shoppings, talvez culpa do sistema da cidade, como
nos diz Pedro Fernandes “ é muitos hipermercados muito juntos e dentro da
cidade e com preços que a gente não tem possibilidade de acompanhar, são preços
muito mais baixos”. De facto o acesso aos hipermercados é mais fácil e é impossível combater preços de
supermercado em certos produtos, por serem frescos, por demorarem a
tornarem-se consumíveis, como as alfaces que Maria Alice Marques produz e vende
“uma alface não conseguimos fazer em
três semanas! Eu tenho lá umas plantadas desde Outubro! É verdade…”,
mas há outros produtos que Maria Alice afirma custarem menos de metade que no
supermercado, e indiscutivelmente “são de boa qualidade, são feitos por
nós, e custam a fazer, mas até são mais gostosos”, e é isso que o
mercado tem de melhor: a qualidade, os produtos frescos e caseiros, e Maria
Alice lamenta, entre os seus vasinhos, plantas e raminhos “ é pena que as
pessoas, por vezes, não saibam! Não sei o que é que nós temos de fazer
realmente para que haja mais jovens a vir”
O mercado é moderno, limpo, arrumado e com óptimas condições de higiene.
Variedade de produtos não falta e tão pouco de preços. A qualidade é
indiscutível e os vendedores estão sempre prontos para dois dedos de conversa.
A história deste mercado construiu ao longo de 172 anos, este lugar fantástico, pedra sobre pedra, mandando embora
o vento e a chuva e que as infra-estruturas antigas não podiam proteger, e
agora, com condições que nunca teve antes, para comerciantes e clientes, vê os
dias cada vez mais difíceis. A crise também não ajuda, mas a mudança de
hábitos, de estilo de vida, são as principais razões para uma sexta-feira de
mercado tão pacata, um dos dias que costumava ser mais efusivo.
A Dona Celeste leva uma das
cestinhas que vende na mão, e vai com pressa, mas ainda nos diz “trabalho aqui
há 51 anos e só me desanimei ontem que não me estreei em todo o dia, não vendi
nada desta vida”. E de velhice prematura sofre este mercado. Um apelo a todos, mas principalmente aos jovens para
que aqui venham comprar, é o recado que os comerciantes nos mandam, na
esperança que possam ver renascer aquele que para alguns foi o seu berço, para outros a sua escola, a sua casa, a
sua vida.
Catarina Rodrigues
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