Na
noite de dia 15 de Outubro, ainda não haviam aberto as portas do
recinto, e já as barracas dos núcleos se pareciam movimentar em torno de
si próprias. Os representantes e os ajudantes de cada curso já fazem a
sua ajuda valer, entre transporte de bebidas e limpezas, enquanto se
organizam para mais uma noite de festa estudantil.
Basta um olhar desvairado pelas barracas
para se denotar já uma constante, ou pelo menos, um aspecto que, ao
contrário dos presentes, se encontra bastante organizado: a crítica
social. Desde metáforas, eufemismos, jogos de palavras e imagens
satíricas, os núcleos não perderam a oportunidade para exprimirem o que,
enquanto estudantes e sobretudo cidadãos, sentem ser a situação actual
do país onde habitam. “Vivemos em tempos difíceis sem certezas para o futuro; a bolha está quase a rebentar e achámos que devíamos representar isso na nossa barraca”, afirmou
João Freitas, aluno de Engenharia Electrotécnica e de Computadores. No
núcleo do curso de Direito, irrompe uma imagem de Marinho Pinto, numa
sátira à situação de entrada na Ordem dos Advogados. Inúmeras referências a um presente incerto, à revolta para
com as novas medidas de austeridade, e, sobretudo, a um futuro pouco
próspero; estas são as previsões, quase unânimes, por parte de toda a
gente presente no recinto, e não só aos representantes dos núcleos.
Ainda não terminada a actuação dos Crookers, cabeças de cartaz desta noite de Festa das Latas, já a tenda dos núcleos que outrora estava vazia se encontra lotada. Entre gin, moscatel, o académico bagaço, Malibu
e a sempre rainha, cerveja, os presentes parecem esquecer o que tanto
lhes custa para viver em Portugal e celebram a união e a vida académica.
Embora haja noites de maior afluência, João Carlos Filipe, de Biologia,
afirma nunca ter visto um ano tão fraco como este: “Duvido que as
pessoas estejam a beber menos, apenas optam por beber em casa e aqui
compram só uma bebida para não parecer mal”. Os preços, fixos pela
organização, também são assunto de discórdia: há quem os ache mais
acessíveis em relação ao ano passado, há quem se conforme, e há quem
ache que as bebidas dos núcleos são “um bocadinho caras”.
O
ambiente vivido na tenda parece reflectir o que realmente se passa no
quotidiano português: as críticas estão presentes, a sátira é
inteligente e necessária, o povo sabe e sabe reflectir nas mudanças que
se têm instalado; no entanto, e em altura de Imposição de Insígnias,
estão sempre dispostos a festejar o que de pouco têm e em união, numa
espécie de amnésia voluntária e temporária, cujas lembranças só voltam
na manhã da ressaca.
por: Eduardo Oliveira
O artigo não está escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
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