Francisco
José Costa Ferreira, 81 anos, natural de Sintra prestou serviço militar
primeiro, seguindo-se depois a guarda nacional republicana de onde saiu
mobilizado para o ultramar, mais concretamente para a Guiné. Conta-nos a sua
aventura, que diz ter sido “uma experiência que nunca se esquece”.
Que ideia é que tinha da guerra muito antes de fazer
parte dela?
Não
sabia do ambiente que lá se vivia. Guerras são guerras e pelas descrições que
nós recebíamos aquelas eram extremamente violentas.
Qual foi a sua reação quando recebeu a notícia de que
iria para a Guerra, como é que encarou a situação? E os seus familiares?
Eu já
tinha indícios porque a mobilização era feita dos mais modernos para os mais
antigos e à medida que se ia aproximando de mim eu sabia que estava já próxima
a minha mobilização. Com preocupação, sempre.
Com que objetivo/missão iam os portugueses naquela altura
para a guerra?
Era a
missão de combater apenas os chamados terroristas, a questão das colónias
portuguesas.
Para além da função de combater propriamente dita, que
outras funções são desempenhadas em ambientes de guerra?
Havia
outras missões, de apoio às populações com o objetivo de as cativar para a
causa portuguesa, para as afastar dos objetivos da libertação. Ajuda
humanitária não havia, apenas apoio de guerra.
Sentiu na pele consequências da guerra?
Sim,
sim. Frequentemente tínhamos ações de combate, tínhamos uma área de
patrulhamento. A zona da Guiné era bastante florestada, nós tínhamos de
caminhar pela floresta, tínhamos de ter a preocupação de evitar rotinas, ou
seja, de variar frequentemente os trilhos de marcha, não seria conveniente
caminharmos sempre pelos mesmos percursos, quanto mais variássemos mais
probabilidades tínhamos de sobreviver. As emboscadas eram frequentes e foi
exatamente numa dessas emboscadas que fomos apanhados, saímos da mata para uma
zona descampada que se chamavam bolanhas que era uma zona que não tinha nada,
no inverno chovia e ficava encharcada de água e quando secava podia-se
caminhar, quando havia chuva nem pensar. Quando estávamos já fora da mata fomos
surpreendidos, como quem diz, porque ali não havia surpresa. Houve um forte
tiroteio e eu fui atingido numa das pernas, com alguma gravidade (fratura
múltipla do fémur) mas consegui recuperar. O socorro foi demorado, fui ferido
às 06:00 da manhã e fui evacuado às 10:00, foi quando foi possível lá chegar o
helicóptero mas para o helicóptero poder aterrar para me transportar tiveram
que utilizar dois aviões de combate.
Que cargo é que ocupou dentro da hierarquia de guerra?
Era
capitão. Já tinha oito anos de serviço, tinha sido alferes, tenente e na altura
em que fui para o ultramar fui promovido a capitão embora já tivesse o tempo
suficiente para essa função. Um capitão comanda uma companhia de cerca de 150
homens, evidente que divididos em 4 pelotões cada um com um alferes como
comandante.
Durante o período em que esteve na guerra pensava na
família, ou seja, sentia que lhe faltava parte de si?
O que
nós pensávamos naquela altura era que aquilo passasse depressa para regressar.
Muitas vezes a guerra deixa nos intervenientes marcas
para o resto da vida, no seu caso sente que isso aconteceu?
Sim
deixou marcas. Há muita gente que tem medo quando houve os tiros, esconde-se
debaixo da cama, entra em pânico, mas nesse aspeto isso não acontece comigo,
mas fiquei bastante marcado, é uma experiência que nunca se esquece.
Se fosse hoje, sabendo o que sabe, podendo escolher
voltava a ir para a guerra?
Não.
Que balanço faz entre o antes e o depois da guerra?
Em
primeiro lugar interrompeu a minha carreira onde eu teria futuro na guarda
nacional republicana e depois em consequência dos ferimentos já não pude
voltar, portanto aí a minha carreira ficou cortada. Não me posso arrepender de
ter ido porque na altura era obrigado a ir.
João Sobral
Grupo 4
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