Portucel |
Local
de passagem do Rio Vouga, Cacia é uma
freguesia que
pertence ao concelho de Aveiro. Ronda, aproximadamente os sete mil habitantes. Conhecida como “ A Avozinha de Aveiro”,
adquiriu importância a nível nacional pela sua
industrialização. Contudo, a sua verdadeira “fama” advém do seu “cheirinho”!
Ninguém
lhe fica indiferente!
A
sirene tocou é sinal de mau presságio. É assim há muitos anos na Vila de Cacia.
Soa como um toque de aviso, algo de mal está acontecer. A sonoridade
transmitida pela fábrica Portucel, não deixa margem para dúvidas, e consciencializa a população caciense para o ocorrido. A distinção é simples, e
faz-se consoante o número de toques, um toque implica ocorrência de uma
acidente, dois é presença de fogo, e por
último, três significa que algo aconteceu fora da área da empresa, explicou
António Pinto, ex- trabalhador da Portucel, fábrica de papel.
Oriundo do Norte do
país, este homem, partiu da sua terra natal com 34 anos. Casado e com três filhos, não hesitou na
mudança. Trazia apenas a esperança de uma vida melhor. Não era o único. Muitos
foram os Homens que abandonaram a terra que os vira nascer. Não por gosto, mas
por pura necessidade.“ Não conseguia viver apenas da agricultura. Quando soube,
pelo meu cunhado, que a Celulose, agora Portucel, estava a precisar de
trabalhadores,vim.”
A primeira sensação é indescritível, a terra que os acolherá
nada tinha haver com a beleza e genuidade da sua. Já não havia o cheirinho do
campo, o verde da floresta nem a tranquilidade da sua aldeia. Essa essência
fora trocada. Por outro lado, viviam agora, numa zona que começava a tornar-se
industrial.
Vivia-se o ano de 1967, e o característico cheiro de Cacia,
que continua a perdurar no tempo, foi o que mais fez confusão á família Pinto.
Intenso e, simultaneamente nauseante, este odor é considerado repugnante.
Exercia a função de analista, ou seja, controlava a quantidade de lixívia,
verificando se a pasta estava crua ou demasiado cozida, fazendo posteriormente
o ajuste. Lavorou na Portucel até à reforma. Por isso, conhece as entranhas da
fábrica. Uma das imagens que melhor retém
da empresa são os inúmeros carregamentos de lenha.Continuam a chegar
diariamente. É uma das portas introdutórias, para quem entra em Cacia pela
primeira vez! Quando questionado pelo odor desagradável que a “Celulose” emite
responde: “ O mau cheiro vêm do cozer do eucalipto ou do pinho que misturado
com químicos que lhe são colocados, formam a pasta, depois de passarem pelas
prensas”.
Matéria prima |
Todavia, a Portucel fornecia algumas regalias aos
funcionários, como o pagamento da época balnear, na Figueira da Foz, aos filhos
dos trabalhadores. Outro tipo de ajuda, era a utilização dos bombeiros nos
momentos de aflição.” Antigamente, os bombeiros
ajudavam as pessoas em situações complicadas e nos fogos que ocorriam
dentro da vila, hoje isso já não acontece!”, explica António.
Por mais questionável que pareça, o “famoso” odor, reconhecido
a nível nacional, não é sentido por toda a Vila. É intenso junto á fábrica.
Poucos são aqueles que acreditam! Ou então, os habitantes já habituados pelo
fedor, não conseguem fazer a perfeita diferenciação. Infelizmente, não são só ares poluidores que abundam
em Cacia. Há muito que perderam o monopólio.
“Em criança brincava no rio”, conta Cândida Rodrigues. Nasceu
em Baião, mas mudou-se com três meses para Cacia. Reconhece que a sua
verdadeira terra, é aquela que a viu crescer. Brincava como muitas crianças,
perto do rio, admitindo que a água em tempos já foi mais limpa. O rio, chamado
Vouga, segue o seu ritmo natural. Passa por Cacia. E talvez, seja nessa pequena
porção de território português , que se inunde. A água outra hora, momento de lazer e descontracção, onde
Cândida e suas amigas se divertiam, passou a ser um local morto. Sim, porque
Pai nenhum deixa uma criança brincar na sujidade. O Rio Vouga, que abraçava as
crianças pela cintura, com alguma transparência, já não o faz. “A água do rio
naquela época ainda não estava tão suja, ainda se conseguia ver alguma
transparência. Nada comparado como hoje.”, afirma a ensaiadora da empresa
Vulcano.
Corpo Privativo de Bombeiros - Portucel |
Paralelamente, outro “buraco” de odor duvidoso foi instalado
em Cacia, mas precisamente em Taboeira. Tudo que é expressamente asqueroso vai
parar aos narizes cacienses. O aterro sanitário de Taboeira é mais um exemplo
da poluição grotesca existente. Mas desengane-se, quem pensa que a poluição
fica por aqui! A introdução das portagens na A25, nas imediações das freguesias
de Cacia e Esgueira (IC1/IP5), bem como, na Zona Industrial de Aveiro e Angeja provocaram para além do
caos nas estradas o agravamento da qualidade do ar.
No âmbito de todas estas problemáticas, nasceu a ADACE.
Associação de Defesa do Ambiente de Cacia e Esgueira em 18/11/2001. Têm a
função crucial de proteger a natureza e de evitar os efeitos nefastos da
poluição já enraizada. Baseado no conceito : “ Todos têm direito a um ambiente
de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado”. É um pequeno grande passo
para a mudança. É a esperança, e simultaneamente a luta para a sobrevivência!
Como é possível viver em tamanha poluição? A resposta é
difícil. Bastante complexa. Talvez como cidadã e habitante de Cacia, local onde
sempre vivi, posso constatar que o que me une à minha origem são os laços
afectivos criados. Apesar da poluição, Cacia foi a terra que me viu nascer,
crescer, que me deu formação. É lá que
reside as pessoas que mais amo. É lá que sou feliz. Talvez, seja esse conjunto
místico que una as pessoas à terra. Viver em comunidade é respeitar-nos
mutuamente, estando em constante ligação com a mãe natureza!
por: Márcia Alves
*Este artigo não foi redigido ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
Existe aqui muita informação errada.
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