Vista a partir da sede da RV |
Inês Antunes é licenciada em Jornalismo e
terminou, no passado mês de outubro, o Mestrado em Comunicação e Jornalismo, na
Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Apesar da possibilidade de
trabalhar em Coimbra, Inês decidiu arriscar e abraçar um novo projeto: a
RaizVanguarda – Associação Cultural, onde assume o cargo de Vice-Presidente.
Esta organização sem fins lucrativos, fundada
em Góis, resultou da vontade de fazer mais pela arte e dinamizar a região.
Embora a RaizVanguarda tenha iniciado a sua atividade em janeiro deste ano, já
teve o apoio da prestigiada Fundação Calouste Gulbenkian e usufrui de um espaço
cedido pela Câmara Municipal de Góis.
Como é que nasceu a RaizVanguarda (RV)?
Inês Antunes: A RV é o resultado da vontade de três jovens, nos
quais me incluo, de desenvolver um trabalho no concelho de Góis e na região
envolvente, relacionado com a arte e com a cultura. Posso dizer que a RV surgiu
de um agradável e inesperado encontro entre mim, o Luís Carvalho e o Denisas
Kolomyckis. Começámos a falar sobre o nosso desejo de permanecer aqui em Góis
mas não queríamos, de modo algum, ficar parados. Queríamos muito desenvolver um
projeto onde pudéssemos conjugar as nossas áreas de formação e, ao mesmo tempo,
dar o nosso contributo humano, profissional e intelectual à região onde nos
inserimos, de modo que a criação de uma associação cultural se revelou no
caminho adequado às nossas expectativas e às necessidades e lacunas que
encontrámos por preencher na nossa área de atuação.
Inês Antunes a cuidar da sede - fotografia por Margarida Sampaio |
Qual a vossa formação e de que modo contribuis para a RV?
I.A.: O Luís é licenciado em Som e Imagem, tem
conhecimentos avançados em fotografia e tem desenvolvido o seu trabalho com
organizações, tendo inclusivamente feito voluntariado no estrangeiro, onde deu
aulas de português e fotografia e ajudou na organização de eventos. O Denisas
tem o curso de ballet clássico mas é um artista interdisciplinar. Tem
desenvolvido o seu trabalho muito na área da performance e do cinema, tendo
trabalhado com Jonas Mekas e Sarunas Bartas e apresentado as suas obras nos
Estados Unidos da América, Rússia e em vários países da Europa. Eu tenho o
Mestrado em Comunicação e Jornalismo e trato de toda a comunicação interna e
externa da RV, apoio na organização de eventos e atividades e na elaboração de
projetos.
A RV nem um ano tem e, não obstante, conseguiu ter o
apoio de vários parceiros. Como explicas este sucesso fulgurante?
I.A.: Quando me fazem essa pergunta, eu costumo dizer que
nada do que atingimos é magia mas sim muito trabalho, muitas horas de dedicação
e empenho. O sucesso – se assim se pode dizer -, é fruto de um bom trabalho de
comunicação com organizações e também da elaboração coerente e profissional de
projetos. Não basta teres uma ideia; os teus parceiros precisam de saber quais
os objetivos daquilo que pretendes desenvolver, qual o público-alvo, quais os
resultados, a longo prazo, do teu projeto. Quando nos apresentamos a um
potencial parceiro precisamos de o convencer de que está a apostar num projeto
sólido e só se chega a resultados positivos com a verdade, criatividade e um
enorme espírito de resiliência. Pelo menos, é essa a nossa postura. Até agora,
conseguimos o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, de algumas Embaixadas, do
Munícipio de Góis e de outras organizações estrangeiras, nomeadamente na
Arménia, Geórgia e Brasil. No que diz respeito a outro tipo de apoios,
lembro-me agora da campanha “Livre-se do seu Mono”, onde pedimos à população
para doar à RaizVanguarda mobília e outras peças de decoração que já não
utilizassem para rechearmos a nossa Sede. As pessoas envolveram-se bastante e
conseguimos mobilar o nosso espaço. Mas estamos a falar da boa vontade da
população; quando se parte para outras instâncias é sempre mais complicado,
mesmo com a postura que temos mantido e que há pouco referi.
Encontraram ou ainda encontram alguma dificuldade?
I.A.: Durante meio ano, andámos a lutar por um espaço que tínhamos pensado ser
o ideal para desenvolver o nosso trabalho, a Casa do Artista de Góis. Depois de
várias solicitações, feitas ao Município, e de meses em reuniões que nos
criaram falsas esperanças, foi-nos indicado que não era possível utilizarmos
aquele espaço. Mas nós nunca baixámos os braços. Finalmente, nove meses depois,
o Município cedeu-nos um espaço para estabelecermos a nossa Sede, a Antiga
Escola Primária de Bordeiro. Foi muito cansativo e, por vezes, frustrante. É muito
difícil conseguir-se afirmar uma associação recém criada, principalmente quando
as pessoas que mais dão a cara por ela são jovens. Devido à nossa idade e,
calculo eu, a um certo desconhecimento sobre o nosso percurso académico e
profissional, senti, inicialmente, dificuldades em sermos levados a sério. Isto
passa-se também com outras instituições ainda hoje. Mesmo com a qualidade das
nossas ideias e projetos, por vezes é difícil obter uma resposta, quanto mais
chegar à fase de concretização. No entanto, com outras organizações,
nomeadamente as que não se inserem na nossa principal esfera de ação, são
bastante recetivas. Por exemplo, o apoio que recebemos da Fundação Calouste
Gulbenkian (FCG) foi um processo muito menos moroso. Bastou termos uma ideia de
um projeto, a desenvolver na Arménia e na Geórgia, apresentá-lo à Fundação e,
em poucas semanas, fomos chamados para reunir com o Diretor das Comunidades
Arménias da FCG. É claro que esta parceria foi o resultado da boa elaboração do
projeto, por parte dos meus colegas Luís e Denisas. Foi determinante definirmos
bem os nossos objetivos, motivações, o contributo que queríamos prestar e,
sobretudo, demonstrar os resultados que advém a longo prazo de um projeto com
esta envergadura. Ainda hoje, mantemos contacto com organizações da Arménia,
com as quais estabelecemos parceria devido a este projeto, e estamos a avançar
com novas atividades de intercâmbio.
O projeto de que nos falas e que foi apoiado pela
Fundação Calouste Gulbenkian foi “A Arte como Ferramenta para a Democracia”.
Como foi esta experiência na Arménia e na Geórgia?
I.A.: Esta experiência foi bastante positiva, a vários
níveis. Primeiro, porque recebemos o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian para
desenvolver o projeto e ter o carimbo desta instituição é um orgulho, um
privilégio para todos nós. Depois, conhecer uma realidade tão distante e
diferente daquela a que estou habituada serviu para alargar os meus horizontes,
conhecer outras culturas e outras experiências de vida. Tive a possibilidade de
entrevistar o Presidente de uma organização que luta pelos direitos da
comunidade gay e pela igualdade de género, na Arménia. É difícil manter este
trabalho num país tão conservador. Já na Geógria, entrevistei uma rapariga que
viveu de perto o conflito armado entre a Geórgia e a Rússia, em 2008. Um
testemunho incrível! Por outro lado, foi muito interessante observar as reações
dos participantes às nossas atividades. Realizámos vários workshops,
coordenados pelo Denisas, onde demonstrámos o trabalho de vários artistas, como
Pyotr Pavlensky, John Lennon, Marina Abramovic, Hermann
Nitsch, entre outros, cujo trabalho está relacionado com a performance. Incentivámos
o debate entre os participantes sobre as suas opiniões acerca das performances
apresentadas e foi interessante perceber que, alguns deles, não estavam
preparados para receber as mensagens dos artistas. No entanto, nós já
contávamos com isto e a nossa função também passa por despertar consciências e
mostrar trabalhos artísticos com os quais as pessoas não estão tão
familiarizadas.
Estão a pensar desenvolver mais projetos deste cariz no
estrangeiro?
I.A.: Sim. Queremos voltar ao Cáucaso e passar pela
Ucrânia. Neste momento, estamos à espera da resposta por parte dos parceiros,
nomeadamente das Embaixadas. É importante referir que não ganhamos nada com
este tipo de projetos, a não ser experiência. As despesas pagas pelos parceiros
são todas ao nível do alojamento, deslocação e alimentação.
A que outros projetos tencionam dar corpo?
I.A.: Recentemente, o Instituto Cultural da Amazónia
entrou em contacto comigo para ajudar na organização da V Mostra de Cinema da
Amazónia, em Portugal. Tratei de toda a comunicação com espaços em Coimbra e no
Porto para a exibição da Mostra e, claro, o evento vai passar também por Góis,
nos dias 22 e 23 de novembro, contando com a presença da Vice-Cônsul do Brasil.
Tudo isto tem o carimbo da RaizVanguarda e estamos, de momento, a preparar a
elaboração de um projeto para apresentar ao Instituto Cultural da Amazónia para
podermos desenvolver o nosso trabalho no Brasil. Por outro lado, temos em mãos
uma atividade chamada “Simulação da Câmara Municipal”, destinada às Escolas da
região e que pretende fomentar a cidadania ativa junto dos alunos. Neste
projeto, os alunos serão divididos em grupos, de acordo com a estrutura dos
Municípios, e irão simular o trabalho desenvolvido nas autarquias. Ou seja, uns
farão parte do Executivo, outros do departamento de Ação Social, Turismo e
Cultura, Obras e Desenvolvimento, e por aí adiante. Os alunos vão ter de gerir
um orçamento fictício e superar os desafios que lhes iremos propor, tentando,
deste modo, melhorar a sua comunidade. O objetivo é que os participantes, no
final, façam uma lista de propostas ao verdadeiro Município e fiquem
conscientes de que a participação cívica é fundamental para o desenvolvimento
da sociedade. Estamos também ansiosos pela chegada de dois voluntários, no
início do próximo ano, que vêm colaborar connosco, ao abrigo do programa
Erasmus+. Apresentámos também projetos à União Europeia para a realização de
formações e estamos a contar com a vinda de 40 participantes. Há mais projetos
em mãos mas ainda são segredo [risos].
Neste momento, está a decorrer uma campanha de angariação
de fundos para a “Escola-Estúdio Raizvanguarda”. Qual é o propósito desta campanha
e de que maneira podemos ajudar a RV?
A sede da RV em Góis |
I.A.: Iniciar esta campanha foi a forma que encontrámos de
contornar as dificuldades que temos tido, no que diz respeito ao apoio para
remodelar a nossa Sede. O espaço onde estamos sediados, a Antiga Escola
Primária de Bordeiro, necessita de algumas obras de melhoramento, nomeadamente
substituição de janelas, reboco e pintura de paredes e tectos. Deste modo,
avançámos com um apelo na plataforma online PPL para que qualquer pessoa
pudesse contribuir. Nesta plataforma, explicamos a nossa situação e as nossas
necessidades. Queremos melhorar este espaço para servir melhor a comunidade e
desenvolver os nossos projetos. Podem ajudar-nos, transferindo o valor que
quiserem através do site [http://ppl.com.pt/pt/prj/escola-estudio-raizvanguarda] ou através do nosso NIB [0045 3453 40262616336 61]. Podem sempre fazer-se sócios,
enviando um email para raizvanguarda@gmail.com.
Por Vanessa Alves Ferreira
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