Maria Martinha
Silva é Assistente Social e atualmente ocupa o cargo de Diretora técnica na
Equipa de Intervenção Social ERGUE-TE da Fundação Madre Sacramento. O programa é
dedicado ao apoio social de mulheres em contexto de prostituição afim de
combater a violência de gênero promovendo o empowerment, a inclusão e a
cidadania. Em parceria com o projeto “Estrutura de Emprego Protegido”, são
oferecidas outras alternativas à prostituição.
Como o projeto ERGUE-TE surgiu e quais são os âmbitos
de ação pela equipa?
A ERGUE-TE
surgiu pois o Carisma das Irmãs Adoradoras é o trabalho com mulheres em
contexto de prostituição desde a origem, desde o século XIX. As Irmãs
Adoradoras estão em Coimbra desde 1990 e desta data à 2009 estiveram em outro
projeto que pertencia à Cáritas de Suzana que era uma casa de acolhimento de
mulheres com filhos ou sem filhos, provenientes de vários contextos de
exclusão, principalmente prostituição. Entretanto, pensou-se a necessidade de
redefinir o projeto pois foram surgindo outras respostas sociais de acolhimento,
e também no âmbito de fidelidade do Carisma das Irmãs Adoradoras, criou-se um
projeto com a possibilidade de maior aproximação de mulheres em situação de prostituição,
assim surgiu a Equipa de Intervenção Social ERGUE-TE, pertencente a Fundação
Madre Sacramento, que por sua vez, pertence às Irmãs Adoradoras. A ERGUE-TE
funciona desde janeiro de 2010, possui um acordo de cooperação que foi aprovado
pelo Centro Distrital de Segurança Social. A Equipa possui dois âmbitos de
ação, um localizado no gabinete, no qual é feito atendimento e acompanhamento
dessas mulheres a nível social, psicológico, jurídico e de saúde, e outro campo
de ação no âmbito da intervenção, que consiste em uma unidade móvel que se desloca
a locais conotados com a prática da prostituição.
Além do apoio social, psicológico e jurídico, quais
são as outras atividades desempenhadas pela ERGUE-TE?
A finalidade de
todo esse programa, de facto é oferecer outras alternativas e possibilidades de
uma nova vida a essas mulheres, portanto criou-se o projeto “Estrutura de
Emprego Protegido” para integrar e preparar elas para as exigências do mercado
laboral, porque a maioria dessas pessoas, sobretudo, portuguesas, são mulheres
com baixa escolaridade e precisam
desenvolver algumas competências para serem integradas no mercado laboral.
Portanto, as mulheres que estão determinadas a abandonar a prática da
prostituição são efectivadas durante um ano na “Estrutura de Emprego Protegido”
e passam a trabalhar e a aprender uma profissão no âmbito da costura e dos
trabalhos manuais. A partir disso, foi registrado a marca ERGUE-TE com produtos
de design próprio e privilegiando a matéria-prima portuguesa.
O atendimento é destinado exclusivamente à mulheres?
Inicialmente só
mulheres eram atendidas, entretanto começamos a receber contactos e pedidos de
ajuda de homens nomeadamente travestis, então nós decidimos alargar a nossa
população e pra além de mulheres, mulheres transexuais em contexto de
prostituição, sendo que para estes a nossa intervenção é especificamente no
âmbito da prevenção da saúde pois não temos qualificações para dar uma resposta
efectiva, já que é uma abordagem muito específica.
Atualmente a ERGUE-TE realiza o acompanhamento de
quantas mulheres?
Não há um número
exato. A Equipa existe desde janeiro de 2010 e de acordo com uma base de dados
criada em 2011, dessa altura até agora, já passam de mil pessoas contactadas.
Com um plano de acompanhamento efectivo e delineado, atualmente temos por volta
de cem pessoas contactadas e acompanhadas por nós, sendo que outras são
contatos mais esporádicos, mas que não deixam de ser nossa população pois nos
encontramos com elas quando vamos aos locais conotados com a prática da
prostituição, elas pontualmente pedem ajuda, ou no âmbito da prevenção de DSTs
ou em outras questões, portanto são ajudas mais pontuais e que não tem um plano
de acompanhamento delineado com objectivos de curto ou a médio prazo.
Há um padrão ou perfil social, etário ou étnico o qual
se enquadra essas mulheres atendidas pela ERGUE-TE em contexto de prostituição?
Depende um
bocadinho. A nossa população atendida não possui um perfil único, até porque
temos mulheres portuguesas, mas mais da metade das pessoas quem contactamos são
estrangeiras, sendo que estas imigrantes tem um perfil mais específico no
sentido de que estão mais isoladas socialmente porque, normalmente, o resto da
família e os filhos estão no país de origem, e dependem do dinheiro que a
mulher envia. Já as portuguesas, normalmente são casadas, possuem filhos e
predominantemente são mulheres de mais idade.
É oferecido alguma forma de apoio às famílias e
especialmente aos filhos dessas mulheres portuguesas?
Sim, nós temos
essa preocupação, pois não trabalhamos só com essas mulheres em atividades de
prostituição mas também com seus familiares, e se há mais membros em idade laboral,
mas não trabalham, integramo-la Estrutura de Emprego Protegido. Se este
membro não integrar este projeto, procuramos perceber que necessidades há no
agregado familiar e procuramos fazer as devidas integrações, como encaminhar
crianças para creches ou escolas ou a procura de emprego
Qual a zona de atuação da unidade móvel de apoio, e
quais os profissionais neste âmbito de intervenção?
A ERGUE-TE é
formada por três técnicos (Assistente Social, Psicóloga, e Educadora Social) e
por um grupo de voluntários, que atuam em todo o distrito de Coimbra, portanto
vamos às estradas nacionais, vamos às ruas da cidade de Coimbra, vamos também à
bares e apartamentos e a todos os lugares relacionados com a prática da
prostituição que saibamos que existam. Esse trabalho de aproximação é feito por
uma equipa de voluntários acompanhados por um técnico.
O que é preciso para ser voluntário na Equipa
ERGUE-TE? Há algum treinamento específico?
Para ser
voluntário é necessário ter vontade e formação. Nós somos muito exigentes
nisso, pois há muitas formas de olhar a prostituição, e nós temos uma forma de
olhar que justifica a nossa foram de intervir, pois temos uma missão, uma visão
e valores que nós defendemos e a pessoa que dá a cara pela instituição deve ser
fiel a essa forma de olhar e ser fiel a essa forma de intervir, por isso, é
necessário um ano de formação. Este ano de formação implica em reuniões mensais
com várias temáticas para contextualizar os voluntários, pois é por eles que as
mulheres irão ser informadas sobre questões em determinadas problemáticas,
tanto no âmbito jurídico e de saúde, como também a nível de respostas sociais na
comunidade.
Em qual local os produtos da marca ERGUE-TE estão
disponíveis para compras? E o que são esses produtos?
Os produtos
podem ser encontrados no espaço da Estrutura de Emprego Protegido, localizado
na Rua da Ilha, ao pé da Sé Velha, são basicamente produtos de origem
portuguesa, sobretudo à base de linho e lã de ovelha. A produção destes artigos,
é pensada não somente em venda com a finalidade exclusiva de ajudara
instituição. Queremos que estes produtos possuam uma utilidade a quem os compre,
por isso são itens de qualidade, pois são confeccionados por essas mulheres que
estão a fazer esse percurso de mudança de vida e inclusão social, portanto
essas peças significam a valorização do trabalho delas e do esforço da mudança
de vida.
O dia 25 de novembro é o Dia Internacional para a
erradicação da violência contra as mulheres, e a ERGUE-TE marcou para este dia
o lançamento de um novo produto. Pode nos dar mais informações sobre o evento?
O evento é para
o lançamento de um novo produto da marca ERGUE-TE mas que é surpresa e só será
possível descobrir no evento marcado para o dia 25 no Centro Universitário
Manuel da Nóbrega (CUMN), perto da Praça da República, pelas 21H15. Esse é um
produto também de muita qualidade, com matérias e acabamentos de excelência que
assinala a valorização do trabalho destas mulheres. Acreditamos que uma das
formas de erradicar a violência é promover o empowerment, portanto fazer a
mulher sentir que há outros caminhos, outros horizontes e outros projetos de
vida e que das mãos delas saem coisas muito bonitas, muito úteis
e de valor.
Por Bruna Becegatto
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