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quarta-feira, 24 de maio de 2017

Quando os que nos protegem não têm proteção

O ano de 2015 foi considerado um ano negro na Polícia de Segurança Pública (PSP), no que toca a suicídios, com 7 mortes.
 Desde o ano 2000 suicidaram-se cerca de 60 polícias. Segundo um estudo feito pela subcomissária Sílvia Caçador, o suicídio é a principal causa de morte não natural entre os elementos da PSP. O Ministério da Administração Interna (MAI) fez também um estudo sobre o suicídio, apresentado a 31 de janeiro de 2017, no qual aponta a causa a razões pessoais ou familiares. Já o presidente do Sindicato Unificado de Polícia (SUP), Peixoto Rodrigues, afirma que “não podemos de forma alguma, e de forma objetiva, dizer que os problemas internos da instituição sejam a causa principal que levam os polícias a suicidarem-se, mas entendemos que há alguns fatores internos que podem de alguma forma contribuir para este desfecho trágico.”
O corte nos salários é uma das principais causas apontadas. Peixoto Rodrigues considera que o Estado não cumpriu com a sua palavra e que há muitos polícias a passarem por problema financeiros. O Ministério da Administração Interna, aquando o contacto, não prestou quaisquer declarações em relação à questão.
 Sobre os apoios aos elementos da PSP que passam por problemas económicos, o Presidente do SUP menciona “os serviços sociais, que de facto têm prestado um excelente apoio aos elementos policiais que têm problemas financeiros, mas que não têm capacidade financeira para ajudar todos os que precisam desse apoio”. O MAI menciona que todos os agentes e funcionários da PSP têm acesso a serviços de saúde próprios, dispõem de várias redes de assistência e de acordos de saúde que permitem a estes profissionais aceder a consultas de todas as especialidades.
Outra das causas apontadas é a distância a que os polícias trabalham das suas áreas de residência, passando pouco tempo com a família.
“Pensamos que para haver um bom desempenho profissional, terá que haver um suporte familiar”, afirma Peixoto Rodrigues. Acrescenta ainda que “neste momento há elementos policiais que estão em Lisboa, que para irem para próximo das suas famílias demoram mais de 15 ou 20 anos. Isto de alguma forma depois causa problemas familiares, e não é por acaso que dentro da polícia se verifica um número muito elevado de divórcios.” Em relação a este ponto o MAI considera que estando a PSP implantada nos principais centros urbanos, tem uma menor dispersão territorial, pelo que é mais difícil aos seus profissionais conseguirem ficar colocados junto das suas residências.
 Outro problema apontado pelo Sindicato reside nos alojamentos. Os agentes têm de pagar usando o salário, sendo que nos postos oficiais é atribuído um subsídio para ajudas de custo.
 “O elemento vem para a Polícia quando acaba o curso, a grande maioria deles vem para Lisboa, muitos deles é a primeira vez que têm um contacto com a realidade da grande metrópole. Não têm familiares nem amigos que os possam de alguma forma encaminhar”, começa por dizer. “Muitos deles alugam quartos até em zonas problemáticas porque, de facto, são mais baratos e os seus salários não lhes permitem que eles consigam arranjar alojamento condigno”. Acrescenta ainda que embora a instituição diga que não está obrigada a arranjar alojamento, deveria arranjar um mecanismo de poder arranjar ou contribuir para que os elementos policiais possam ter alojamento, de forma a melhorar a sua qualidade de vida.
 O Presidente dos SUP refere ainda que a situação dos alojamentos só se verifica na classe de agentes e chefes. No estatuto que rege a classe de oficiais, está inserido um subsídio de renda de casa. “Quer dizer, aqueles que melhores salários têm, são aqueles que de alguma forma têm mais benefícios. Este tipo de subsídios deveria ser atribuído a todos os elementos policiais”, afirma com incompreensão.
 Prosseguindo nas causas apontadas para os problemas entre os polícias está a progressão na carreira, que está atualmente estagnada. Peixoto Rodrigues dá o exemplo de que na classe de chefes, abriram 50 vagas para chefe principal, num concurso com mais de 2000 candidatos, o que “não cumpre a necessidade de chefes principais atualmente necessários”. No caso dos oficiais isso não se verifica, podendo progredir na carreira mais rapidamente. “A sua carreira está praticamente garantida. De três em três ou de quatro em quatro anos é progredir na carreira”, afirma.
 “As carreiras estão completamente estagnadas e isso também contribui não só para a desmotivação dos elementos profissionais, como põe em causa os seus salários”, aponta o presidente do sindicato.
Em relação a este assunto, o Ministério da Administração Interna afirma que “considerando que temos oficiais que aguardam a sua promoção mais do dobro do tempo do que estatuariamente está previsto, não nos parece haver grande distinção”.
 O trabalho por turnos está provado ser também uma das causas para problemas psicológicos. O Presidente dos SUP sugere a criação de mais escolas de polícia, visto que é necessário mais elementos para que se possa aliviar a carga horária.
 A relação entre oficiais e os seus subordinados também preocupa o Sindicato, pois o contacto é feito muitas vezes à distância, “por e-mail ou por telefone, portanto o contacto pessoal não existe”.
Acrescenta que “deveria haver por parte da hierarquia uma relação muito mais próxima com os seus subordinados, numa perspetiva de tentar perceber se eles precisam de alguma ajuda.” É ainda apontada a pressão para passarem mais multas e fazerem mais detenções.
Falando agora da resolução dos problemas psicológicos, o Presidente do Sindicato Unificado de Polícia diz que muitos elementos não procuram apoio psicológico dentro da instituição e escondem que estão a passar por problemas. Fazem-no, porque isso implica que lhes seja retirada a arma, não podendo por isso realizar serviço operacional, o que implica consequentemente cortes nos salários.
 Os Sindicatos sugeriram ao Ministério que arranje um mecanismo financeiro para que os polícias não sejam prejudicados.
Peixoto Rodrigues considera que “as medidas a que temos assistido são manifestamente insuficientes”. Afirma ainda que “se o poder político continuar a não olhar para a polícia como uma profissão fundamental para garantir a segurança no país, dando aos seus profissionais salários condignos com essa sua condição, melhores condições de trabalho e melhoria na relação entre as hierarquias, parece-nos a nós que não vai ser o apoio psicológico que vai ultrapassar estas questões.”
 Apesar das notícias que dão conta dos suicídios e dos problemas vividos pelos elementos da PSP, o Ministério da Administração Interna refere que “no último concurso tivemos mais de 10.000 candidatos, sendo que o n.º de aprovados excedeu largamente as vagas disponíveis, e a cada concurso registamos uma cada vez maior percentagem de jovens com formação superior”.
Em relação a este ponto é dito pelo Sindicato que a polícia é opção para quem não consegue arranjar emprego noutras áreas de ocupação coincidentes com as suas habilitações. “Pessoas com boas qualificações não querem de alguma forma vir para a Polícia ganhar um salário base de 800€ que é manifestamente insuficiente para o risco que vêm correr”, comenta.
 De qualquer forma, mostra o seu agrado dizendo que “enquanto polícia e enquanto Presidente de um Sindicato, fico muito contente e satisfeito em que cada vez mais venham jovens para a instituição.”
Finalizando os problemas vivido pela PSP, o presidente do Sindicato Unificado de Polícia considera que o Ministério da Administração Interna e a Instituição da PSP não assumem a responsabilidade nestes graves problemas. “Declinam sempre essa responsabilidade, atribuindo a culpa dos suicídios a causas particulares, o que nós não podemos concordar, porque de facto há fatores internos que contribuem para esse desfecho.”
No ano de 2016, suicidaram-se dois agentes da PSP.

Andreia Rodrigues

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