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terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Reportagem - A tradição ainda é o que era

A tradição ainda é o que era



Por Helena Gonçalves


Nos dias de hoje, torna-se cada vez mais comum a existência de uma ocupação extra que funcione como uma “escapatória” à monotonia do dia-a-dia. Numa tentativa de dar sentido à vida e tornar cada dia mais interessante, existem cada vez mais pessoas que optam por pôr em prática as ideias ou os sonhos que nunca viram realizados, seja abrir um restaurante, ver crescer a sua horta no quintal ou mesmo criar a sua própria empresa.



Natália Filipe, professora de geografia de uma Escola Secundária de Torres Novas, é o exemplo vivo de quem ambicionou por mais. Entre as aulas e as responsabilidades escolares que acarreta, Natália tem ainda tempo livre para gerir uma microempresa artesanal de licores em parceria com o seu marido, Manuel Filipe.

Esta ideia surgiu do gosto pessoal pelo fabrico artesanal de licor transmitida pelas suas gerações anteriores. Uma arte outrora feita como um mero passatempo, tornou-se agora um segundo emprego. Durante anos, coleccionou diferentes garrafas, a que associou licores diferentes. Hoje conta com mais de 130 garrafas e licores distintos. São os “Segredos da Tradição”.

Natália Filipe assegura que “este projecto começou por mero acaso. Por brincadeira, criávamos alguns sabores que oferecíamos a amigos e familiares pelo Natal e épocas festivas. Acabámos por nos entusiasmar ao tentarmos sempre novos sabores”. No entanto, o prazer de oferecer licores a amigos e conhecidos ajudou a “espalhar a palavra” e a dar a conhecer ao povo torrejano este produto artesanal. O sucesso que fez entre a população levou a câmara municipal de Torres Novas a convidar Natália a expor os “segredos da Tradição” como produto regional na Feira dos frutos Secos, um dos acontecimentos mais emblemáticos da região. A Associação para o Desenvolvimento Integrado do Ribatejo Norte (ADIRN) foi a grande impulsionadora do projecto “no intuito também de recuperar um produto e valorizar a região”.

Com o passar do tempo, Natália apercebeu-se que o produto que representava não era “comum” no mercado, sobretudo quando feito de forma tradicional. Em cinco anos de actividade, a professora de geografia tem conseguido introduzir sempre algo novo no mercado, variando consoante as estações. “A recolha dos ingredientes é feita em fases específicas do ano, consoante o licor que se vai fazer. Por exemplo, o licor de tangerina é feito durante a Primavera, altura das tangerineiras darem fruto”. Hoje, com um conhecimento mais aprofundado das exigências do mercado, já possui um vasto stock e diversos sabores.

Tal como o próprio nome da microempresa indica, “Segredos da Tradição”, a confecção de cada um dos licores é um segredo de família, sendo por isso, uma tradição valiosa e a preservar. Para além das receitas regionais, que têm imensa tradição no trabalhar da aguardente, outras se juntaram, do país e de outros países, como é o caso do licor de pimenta da Jamaica.

Alguns dos licores mais procurados são o de folha de figueira, o do figo seco, o do figo preto e o de amêndoa, frutos característicos da zona ribatejana. No entanto, existem muitos outros sabores à escolha: tangerina, chocolate, canela, poejo, café, baunilha, etc; e outros que despertam a curiosidade do consumidor, como o de roseira brava.

“Tal como todas as empresas, sejam elas de pequena ou de grande dimensão, também os “Segredos da Tradição” tem todos os requisitos legais e as instalações apropriadas para este tipo de produção artesanal, com marca e receitas registadas” quis a mentora deste projecto reforçar.

Esta iniciativa do casal Filipe, com apenas cinco anos de duração, é já uma empresa de sucesso. Sem recorrer à publicidade, os “Segredos da Tradição” chegaram já aos meios de comunicação social que os deram a conhecer a todo o país.

O mercado que mais consome os seus licores é “o mercado “Gourmet” e os amantes de licores que querem sempre acrescentar os novos sabores à sua colecção. Também recorrem muito aos nossos produtos para ofertas nos casamentos”, acrescenta.

No entanto, Natália não fica por aqui no que diz respeito a projectos da sua autoria. Para além desta microempresa e do seu cargo como professora, esta mulher multifacetada, apaixonada pela sua cidade natal e por todos os seus encantos, esteve ainda envolta num outro projecto de sucesso. Para preservar ainda a tradição e “o que de bom tem esta terra”, Natália levou a cabo, juntamente com alunos seus, uma actividade que consistiu na compilação num livro de todas as receitas doces características da região. “Há que dar a conhecer a todos o valor da tradição e Torres Novas tem muita, apesar de pouca gente o reconhecer”. O seu próximo objectivo será da mesma natureza, uma vez que ambiciona escrever um novo livro sobre a história dos licores, de forma a complementar e a dar uma razão de ser ao seu trabalho. “Os licores começaram por ser remédios e ainda hoje são usados com várias finalidades. A ginja, por exemplo, tem propriedades terapêuticas abrangentes”, declara.

Tal como Natália Filipe, existem muitas outras pessoas que se ocupam de actividades “extracurriculares” para preencher os seus dias e para se sentirem preenchidos. Com o passar do tempo, apercebemo-nos que a tradição vai desmoronando-se aos poucos. Ainda bem que existem pessoas que se esforçam por mantê-la viva.

Grupo 5



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