Crise
vs. Educação. O que fazem os
jovens estudantes portugueses para combaterem a crise?
GERAÇÃO À RASCA QUE SE DESENRASCA
Apesar das enormes dificuldades por que têm de passar,
os jovens estudantes portugueses mostram-se capazes de superar os obstáculos
que lhes são colocados ao longo da sua formação. Pagar as propinas e
sustentarem-se a si próprios são algumas dessas barreiras que conseguem
ultrapassar com um espírito de garra, esforço e dedicação.
Por Isabel Oliveira
P
|
ropinas,
100 euros; renda do quarto, 150 euros; despesas da água, luz, gás e internet,
30 euros; transportes, 75 euros; alimentação e outros gastos, 80 euros. Esta poderia
ser a factura média mensal de um estudante deslocado, do Ensino Superior, na
cidade de Coimbra. Despesas que rondam os 500 euros mensais não são fáceis de
ser suportadas, mas esta é a realidade por que têm de passar os universitários
se querem investir no seu futuro.
Os Universitários vêm-se obrigados a fazer muitas
contas para perceberem o que gastam e onde podem poupar.
Numa altura
em que os valores das propinas sobem, as bolsas de estudo da acção social
diminuem, as rendas da casa, transportes e alimentação são cada vez mais caros,
muitos estudantes vêm-se obrigados a desistir de estudar, com impossibilidade
de comportar tamanhos gastos. Segundo dados revelados pela Associação Académica
de Coimbra, até Março do presente ano, já 600 estudantes da academia coimbrã
tinham abandonado a Universidade.
Cartaz da
AAC (Associação Académica de Coimbra) mostrando o desagrado com a diminuição
das bolsas de estudo e as suas consequências: 600 estudantes abandonaram o
Ensino Superior. Por: Isabel
Oliveira
Ver os
filhos tirarem um curso superior é o sonho de qualquer pai. Mas o que podem
fazer as famílias portuguesas para verem este sonho tornar-se realidade? Num
país em que as palavras da ordem do dia são FMI, Troika, dívidas, desemprego,
crise, crise e mais crise, pouco ou nada podem fazer para ajudar os filhos. ‘A vida está cara’ é
o que mais costumam dizer os portugueses quando confrontados com a sua situação
económico-financeira. Para além de se verem privados de aumentar o poder de
compra e de melhorar as suas condições de vida, porque simplesmente não há
dinheiro, não conseguem simplesmente dar continuidade à formação dos filhos. Como
muitas vezes afirmou José Sócrates, a educação e o investimento nos mais jovens
é a base para o desenvolvimento do país. Com os desenvolvimentos políticos a
que se tem assistido juntamente com as dificuldades de financiamento no sector
da educação prevê-se dias muito complicados para uma geração que se tem
intitulado de ‘geração à rasca’. Geração esta que se vê responsável por si
própria, pelo cumprimento dos seus e dos sonhos dos familiares e pelo
desenvolvimento do país. A maioria dos jovens portugueses universitários não se
querem juntar aos 600 apontados pela AAC, pois, pretendem ver realizados os
seus desejos. Cabe a cada um encontrar soluções para combater a crise, que em
muitos casos passa por arregaçar as mangas e começar a trabalhar.
Exemplos de Sacrifício
Olivia
Silva, estudante do Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas na
Universidade de Coimbra, é um exemplo da vontade e coragem dos jovens de
prosseguirem os estudos graças ao seu esforço. “Sou guia no Jardim Botânico de
Coimbra. Para além da importância monetária deste part-time é-me igualmente
útil por estar dentro da minha área de estudo pois uma das áreas de
investigação para o desenvolvimento de novos fármacos é o estudo dos
constituintes das plantas. Como aluna de MICF acho interessante saber que
plantas podem ser usadas na medicina e que plantas pelo seu perigo não devem
nem ser usadas na medicina tradicional. Como futura agente de saúde pública
acho que é uma mais-valia saber identificar essas plantas para poder aconselhar
os utentes” afirmou a estudante que se sente realizada por conseguir juntar o
útil ao agradável, ou seja, ganhando dinheiro fazendo o que gosta. Para esta
estudante, é muito importante o dinheiro que ganha com este pequeno part-time,
pois lhe permite cobrir os gastos do seu dia-a-dia. Não sendo um exemplo com
uma situação económica muito negra, quer, ainda assim, manter este trabalho,
pois considera ser muito importante para não sobrecarregar tanto os seus pais.
Um conjunto de factores faz com que Olivia adore este trabalho: boa recompensa
monetária, é na área que gosta e pretende trabalhar futuramente e não lhe ocupa
grande tempo, conseguindo conciliar na perfeição com os estudos. Sendo uma
estudante deslocada, pois é oriunda de Pombal, mas estuda no centro de Coimbra,
aproveita o ordenado, essencialmente, para as despesas alimentares e relativas
aos transportes.
Já Sandra
Antunes, estudante de Comunicação Social na Escola Superior de Educação de
Coimbra, tem uma situação económica bem mais difícil. Os seus pais, com muita
pena, não conseguem suportar os custos com a educação da filha. Contudo, a
estudante não vira as costas às dificuldades. “Trabalho num quiosque dentro de
um Centro Comercial, vendendo cafés, bolos e tostas. Já trabalhei também num
call center da PT. Não posso estar parada sem trabalhar, porque tenho muitas
despesas a pagar e, por isso, tenho de fazer qualquer coisa”, afirma a
estudante. Orgulha-se de ser independente, por conseguir pagar as propinas, a
renda do seu quarto, e todas as outras despesas com o seu próprio dinheiro, mas
sente-se desiludida por não trabalhar no que gosta. Deixando por vezes as
obrigações escolares um pouco de lado, Sandra assume que foi fácil arranjar
trabalho, no entanto “as condições são terríveis”, em que os patrões abusam
muito por haver muita procura.
Daniela Nunes faz animações em festas para crianças |
Mas nem todos os
estudantes encontram facilmente trabalho que consigam conciliar com os estudos.
Estudante de Educação Básica, Daniela Nunes aproveita o tempo das férias para
fazer limpezas em casa de vizinhos e animações em festas para crianças. “Prefiro
sem dúvida fazer animações em festas para crianças, pois é com elas que quero
trabalhar futuramente. Mas é fazendo limpezas que ganho mais dinheiro, por isso
não posso dizer que não ao trabalho que me aparece”, disse, a futura
professora. Fazer limpezas não é o trabalho ideal, mas é o perfeito para quem
precisa de dinheiro.
Para a maioria dos estudantes
trabalhar é a solução para pagar os estudos. Sujeitam-se a qualquer trabalho
para superar os elevados valores das propinas.
Estes são
apenas três estudantes que mostram a realidade de muitos jovens portugueses.
Uns conseguem conciliar a sua área de interesse com as questões monetárias,
outros nem por isso, mas não é por isso que deixam de trabalhar, desistindo da
sua vida. Contra todas as dificuldades, contra a crise, mas a favor dos seus
sonhos, do seu futuro, os jovens mostram-se à altura de qualquer desafio.
Trabalham, lutam e vêm a sua dedicação estampada na hora de pagarem as despesas
com o seu próprio dinheiro. Conseguir cerca de 1000 € por ano (valor médio
aproximado das propinas em Portugal) não é fácil, mas, como se consegue
perceber a ‘geração à rasca’, afinal, consegue desenrascar-se. Mas valerá a
pena este esforço grandioso para conseguir um curso superior, atendendo aos
elevados valores de desemprego que apresenta Portugal?
Futuro incerto
“Quanto a
perspectivas, acho que me fui desiludindo com o sistema, sonhei ter um futuro,
e agora apercebo-me que vou ter outro completamente diferente” acrescentou
Sandra Antunes, que aspirava seguir uma carreira na área da Comunicação Social.
Acredita que o esforço vale a pena, nem que seja pelo simples facto de se
sentir independente, “sem depender de ninguém” na hora de pagar as contas.
Já Fernando
Pessoa afirmava que “Tudo vale a pena quando a alma não é pequena”. Com grandes
almas cheias de espíritos de sacrifico, entrega, dedicação e luta pelo que
querem os estudantes mostram que é possível combater a crise. Mesmo sem um
futuro garantido, os jovens já não se sentem os mesmos com a realização dos
seus grandes sonhos: licenciarem-se.
Por:
Isabel Oliveira, Redacção 1
Sem comentários:
Enviar um comentário