Coimbra corteja, e bem! Ficar rendido ao desfile da Latada que serpenteia
por entre as principais ruas e artérias da cidade é inevitável – que o digam os
estudantes.
A tradição não está em crise, contudo a instabilidade marcou o cortejo.
Por um lado, a instabilidade política e financeira do país retratada através de
sátiras, por outro, o desequilíbrio de alguns estudantes já mais animados e
festivaleiros. Note-se, ainda, o facto de o cortejo se realizar a 1 de
Novembro, dia de Todos os Santos! Enquanto uns choram, outros riem. E o mesmo
se passa no Cortejo da Latada.
Em dia de cortejo, em Coimbra, não existe uma percepção temporal. Há algo
de místico e de inexplicável em fazer parte de uma tradição secular. É vibrante
ser parte integrante da acção e do acontecimento que, outrora, apenas se ouvia
relatar. Creio que a maioria dos doutores se sentiu assim: como continuadores
de uma saga ancestral que a cada ano se repete no conteúdo e se renova na
forma.
A tradição continua.
Os caloiros de ontem são os doutores de hoje, apenas trocaram a chupeta e o
penico pelo grelo e pela pasta, apenas aprenderam a valorizar o traje académico
e a olhar Coimbra com saudade. É com dedicação e originalidade, e sempre fiéis
às cores da faculdade, que os doutores vestem os afilhados a rigor para o
desfile da Latada. Os passos até ao rio Mondego são os mesmos do que há um ano
atrás, mas o sentimento é um tanto ou quanto diferente. É verdade, doutores, os
papéis inverteram-se! Hoje, com a capa traçada, são os "caloiros do ano
passado" que baptizam, no Mondego, os seus afilhados.
O real conteúdo do cortejo da Latada é conduzir e "abençoar"
nas águas do Mondego os caloiros, é conduzi-los a uma nova etapa.
Neste dia, há a percepção de que a cidade do conhecimento não ensina
apenas nas salas das universidades, mas também nas ruas, caindo,
chorando, rindo.
Há excessos e excessos. Exceder pode significar, em alguns casos,
ultrapassar. Considero o cortejo assim, um ultrapassar de barreiras
ideológicas, uma comunhão entre cursos e faculdades, o ser baptizado, o ser
doutor, o ser finalista! Expandir o corpo, a alma e a mente. É assim que
defino, se é que se define, o que muitos estudantes sentem nesta altura.
As consequências? Um dia diferente, motivador e, com certeza, para ficar
nas memórias de Coimbra e de uma vida.
Na baixa da cidade, o comércio ganha com a atracção académica e a chegada
de visitantes. No trajecto dos caloiros, desde o Largo D. Dinis até ao rio
Mondego, são muitas as latas que ficam para trás, são muitas as fontes que
baptizam os recém-chegados estudantes.
Prezo a tradição, prezo uma realidade vivida e uma saudade eterna. Mesmo
quando o país se afunda nos braços sufocantes da Troika e do FMI, mesmo quando
o mundo evolui e se moderniza, mesmo quando se diz que as novas gerações não
preservam nem valorizam o passado… A Latada de Coimbra ensina, todos
os anos, a caloiros e a doutores, o significado do legado e do espírito
académico!
Paula Cabaço
Redacção 2
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