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terça-feira, 23 de outubro de 2012

Vamos ver os bonecos?

Lembro-me de contar os minutos de toda a publicidade que passava na televisão enquanto não começavam os meus desenhos animados preferidos. Nunca desapareceu da minha memória o som do clique do botão on da velha televisão da minha bisavó. De facto, a hora dos “bonecos”, que era geralmente a meio da tarde depois de chegar da pré-escola, era o meu ritual sagrado. E digo-vos, muito aprendi com o tipo de desenhos animados que vi.
Normalmente, as crianças começam a adquirir esta rotina com cerca de dois anos de idade. Ao longo do tempo, este costume entranha-se mais intensamente no quotidiano das crianças passando a ocupar um lugar de destaque no seu dia-a-dia. E, consequentemente, a educação juvenil começa também a formar-se através da visualização destes conteúdos.
Apesar de tudo, na minha opinião, já não se fazem desenhos animados como antigamente. Actualmente, a violência preenche muitas vezes os ecrãs da televisão deixando de lado valores como o amor, a ética ou a entreajuda que se encontravam facilmente há anos atrás.
No meu tempo, desenhos animados como a Heidi, o Marco ou o Dartacão incutiam o gosto pela história ou pela geografia e impunham-nos princípios como a união, a amizade, a moral. Todavia, hoje em dia, frases como “vamos lutar”, “desafio-te para um combate”, ou palavras como “guerra”, “luta”, “sangue”, “morte” preenchem a panóplia de expressões dos programas juvenis.
Quando às nove horas de uma manhã de sábado ligamos a televisão num canal generalista conseguimo-nos logo deparar com uma série de desenhos animados que contêm violência nas suas mais diversas expressões e essa violência poderá traduzir-se, em alguns casos, em atitudes agressivas por parte dos mais novos.
A meu ver, este tipo de manifestações poderão afectar o público jovem que, como ainda não conseguem discernir correctamente entre a realidade e o imaginário, consideram que o mais forte e maldoso será sempre o detentor da razão. Além disso, na sua mente, formar-se-á a ideia de que será através do uso da violência, do medo, da ameaça e da mentira que conseguirão chegar a um dado objectivo.
Todo o processo cognitivo que se desenvolve na mente da criança não termina aquando a visualização dos conteúdos televisivos. Os próprios jovens, posteriormente, discutem a acção dos seus heróis preferidos em ambientes externos (como a escola, por exemplo) o que poderá, muitas vezes, levar à própria violência entre eles. Para além disso, poderão ganhar fobias e medos de situações quotidianas ou tornar-se apáticos às infelicidades dos outros.
Outra consequência será o consumismo – os mais novos procurarão artigos que tragam a marca dos seus desenhos animados preferidos o que se traduzirá em maior gastos para os pais.
Os teores televisivos direccionados para os mais novos proporcionam a formação de gostos e de ideais nos quais se poderão basear para actuar nas mais diversas situações. Por isso, em vez de se dar uso à violência, às artes marciais, aos poderes sobrenaturais, foquemo-nos no essencial: devemos saber incutir nas crianças princípios sociais mais profundos de forma a que sejam, no futuro, bons cidadãos. Essa educação passa também pelos pais que devem saber escolher uma programação juvenil mais rigorosa e educativa (como aquela que eu adquiri com os desenhos animados mais antigos) que sirva de mote para um desenvolvimento mental favorável à criança.
Contudo, há que deixar a criança sê-lo, de facto. Não digo para deixarem de ver todo o tipo de programação televisiva, apenas que sejam selectivos, até porque os desenhos animados sempre serão parte integral da vida de uma criança e devem continuar a sê-lo. Por isso, não percam o próximo episódio, porque nós também não.

por: Rita Mendes
*O artigo não está escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico 

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