Várias são as crianças entregues a instituições para adopção, quer por
razões económicas, quer por questões familiares complicadas. Segundo a Caracterização
Anual da Situação de Acolhimento (CASA) da Segurança Social, no ano de 2011, 379
crianças foram acolhidas, mas a lista de espera não pára de crescer.
Porém, a questão da adopção não começou a existir só agora. Bruna
Graça tem 21 anos e desde cedo que se deparou no sistema vigoroso e demorado das adopções. O Posts de
Pescada quis conhecer melhor
esta realidade e entrevistou-a.
Bruna Graça: A adopção
plena só a consegui com 10 anos, mas fui adoptada em Maio de 1993, com dois
anos e dois meses.
PP: Então foi um processo
complicado?
BG: Sim. A minha mãe
biológica nem sempre era cooperante. Nem sempre aparecia nas audiências em
tribunal.
PP: Estavas em algum
orfanato?
BG: Não. Estive três meses
em casa de uns senhores que adoptaram a minha irmã, mas depois a minha mãe foi
buscar-me.
PP: Os teus pais adoptivos
conheciam a tua mãe biológica?
BG: Sim, porque a viam lá
na rua. A minha avó biológica trabalhava para a minha avó adoptiva, e os meus
pais conheciam assim mais ou menos a minha história.
PP: E o teu pai? Estava de
acordo com essa situação?
BG: Nunca soube quem é. Em
tempos pensou-se que fosse o mesmo que a minha irmã, mas a minha mãe negou. Já
desconfiaram que fosse um militar que tinha estado no quartel em Tomar, porque
ela ainda chegou a estar com ele. Mas pelos vistos não se tem a certeza, e ela
também nunca quis contar a ninguém…ou porque era segredo, ou porque não sabia,
aí fica a questão.
PP: E o resto da tua
família biológica?
BG: Viviam no bairro e
ainda vivem. É gente ligada à prostituição e à bebida. Nunca tive contacto com
eles, só sabia quem eram.
PP: Depois de teres ido
para casa dos teus pais adoptivos, estiveste mais alguma vez em contacto com a
tua mãe biológica?
BG: Sim. Ela aparecia de
vez em quando para me levar a passear, e os meus pais ficavam cheios de medo
que eu não voltasse. Mas a última vez que ela me foi visitar foi no Natal de
1993 e só me deixou um boneco como recordação. Pelos vistos, nesse dia, ela fez
um ultimato aos meus pais: ou eles davam-lhe dinheiro, ou ela levava-me. E
desde aí que ela nunca mais apareceu.
PP: Tens irmãos biológicos?
BG: Que eu saiba só um.
Meia-irmã. Chama-se Cátia e tem 24 anos. Foi adoptada com um ano. A minha avó
vivia com o meu avô, que andava numa cadeira de rodas, e alguém os denunciou
por andarem sempre embriagados e não conseguirem tomar conta dela. Mas aí a
história é mais complicada e já envolve os senhores que a acolheram.
PP: E quanto à família com
quem vives, porque decidiram acolher-te?
BG: Fui passar um dia a casa deles, mas quando me foram entregar à minha avó, ela não me quis, apenas disse que eu pertencia a eles. Nem sequer
abriu a porta, falou pelo postigo. Os meus pais saíram de lá e foram
contar o que se passava à assistente social. Foram à segurança social e depois
surgiu a questão da adopção. Nunca mais ninguém soube do rasto da minha mãe.
PP: Foste adoptada com dois
anos, mas os teus pais adoptivos contaram-te sobre a tua adaptação?
BG: Sim, sei tudo.
Supostamente receberam-me a pensar que só ia ficar uns dias ou um
fim-de-semana. A minha avó biológica deixou-me em casa deles apenas com uma
mochilinha com roupa. Eu estava cheia de piolhos e toda suja, tinha feridas e a
fralda de pano estava parcialmente agarrada à pele porque não me mudavam a
fralda há muito tempo. Muitas vezes encontrava cascas de batatas e começava a
comer, porque era o tipo de alimentação a que estava habituada na outra
família. Quando cheguei a casa deles, tinha medo do meu pai, tremia quando ele
chegava perto de mim. Pelos vistos tinha medo de homens e nunca ninguém soube o
porquê. Mas adaptei-me muito rapidamente.
PP: Foste a única que eles acolheram?
BG: Não, adoptaram o Tiago
quando eu tinha nove anos.
PP: E como reagiste quando
eles te contaram?
BG: Adorei! Queria ter um
irmão, e ele era mesmo recém-nascido. Fui vê-lo ao hospital com dias de vidas,
e quando saí de lá comecei a chorar como se não houvesse amanhã, com medo de
não o voltar a ver. Foi para nossa casa na semana a seguir, com 15 dias.
PP: Por fim, condenas a tua
mãe por te ter deixado com os teus pais adoptivos?
BG: Nunca! Agradeço! Se não
o tivesse feito, não saberia o que seria de mim agora.
Por: Vânia Santos
*Este artigo não está escrito ao abrigo do
novo Acordo Ortográfico
Etiquetas: Adopção, Mãe biológica, Pais
adoptivos, família
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