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terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Reportagem: Uma porta aberta para novas oportunidades

Comunidade Juvenil São Francisco de Assis

Uma porta aberta para novas oportunidades

Acolhe crianças e jovens em risco, oferecendo novos rumos e oportunidades de vida. Nesta instituição, sediada em Coimbra, só aproveita quem quer e, com o tempo, as hipóteses de mudança são cada vez menos reconhecidas por parte dos beneficiados.

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades. É isso que é possível observar ao transpor os portões da Comunidade Juvenil São Francisco de Assis, onde as crianças se confrontam constantemente umas com as outras e onde algum individualismo é observável. São crianças e jovens que passaram por situações complicadas, enviados pelo Tribunal de Família e Menores sendo, na sua maioria, das zonas de Coimbra, Aveiro e Leiria.
Na periferia da cidade, rodeada pela natureza, esta Comunidade é como que uma pequena aldeia, composta por “casinhas” pré-fabricadas, onde as crianças estão divididas por sexo e idade. Os risos não são facilmente perceptíveis, reinando o silêncio ou o som dos pássaros. Os residentes ocupam-se a estudar, a andar de bicicleta dentro do recinto, a aprender ballet ou simplesmente a conversar com os companheiros, dentro dos seus “lares”.
Ao ver alguém que não lhes é próximo, têm dois tipos de reacção: fechar-se dentro de casa ou, talvez por curiosidade, tentar saber quem é tal pessoa. Esta última reacção ocorre, especialmente, nas crianças mais jovens. 
Também no que diz respeito à importância deste lar de acolhimento há uma divisão de opiniões: Clara (nome fictício), uma menina que frequenta o ensino básico, vê a Comunidade como um mero colégio, que em nada irá alterar a sua vida. Já a Sara (nome fictício), da mesma idade, tem uma consciência diferente, dizendo que “é importante porque há aqui várias crianças que não tem condições para estar com os pais e aqui têm um lugar com mais condições para estar e é divertido estar cá.” 

Uma oportunidade de traçar objectivos e de concretizar sonhos

A organizar projectos de vida desde 1970, Maria Teresa Granado, actual directora-técnica e criadora do projecto tem como objectivo “dar oportunidades a crianças com histórias difíceis, ajudando-as a desenvolver diversas competências e incutir-lhes valores e responsabilidades.”. A propósito deste último factor, as crianças e jovens são responsáveis por actividades diárias como a arrumação e limpeza da casa, a lavagem da roupa. Possuem ainda uma mesada, tendo de fazer a gestão da mesma. No caso dos jovens, desde que autorizados, podem ausentar-se para passear ou sair à noite. Toda esta rotina diária é acompanhada por técnicos, responsáveis por grupos de crianças, e por auxiliares de acção educativa, que os ajudam com maior frequência nas tarefas domésticas.
Quanto à noção que os adolescentes têm das mudanças possíveis de ocorrer, estando ali, há, mais uma vez, uma divisão. Alguns referem o facto de poderem prosseguir estudos, enquanto outros são da opinião de que nada mudará. Apesar disso, sentem-se bem naquele local, destacando o afecto dado pelos amigos. Ana (nome fictício), fritando salsichas que espalham pela casa um odor agradável, conta que “não é onde eu queria estar, mas é bom, sinto-me bem”. A jovem foi retirada de um bairro social onde não tinha condições de vida.

Jovens não chegam à Comunidade com os mesmos valores de antes

            Ao longo dos anos, a sociedade foi-se alterando a vários níveis, nomeadamente ao nível dos valores, das expectativas e da mentalidade das pessoas. No início do projecto, a instituição acolhia filhos de emigrantes e outros que viviam em situação de miséria ou de maus-tratos. Eram crianças que não conheciam bem a realidade e eram pobres, especialmente as que vinham das pequenas aldeias. Hoje, “não são tão pobres como dantes, mas são pobres de carinho e de ternura”, refere Maria Teresa Granado. Acrescenta, ainda, que estas “vêm mais fragilizadas, mais agressivas do que antes, devido à falta de afecto.”.
                Segundo Ana Abrantes, psicóloga da Comunidade Juvenil São Francisco de Assis, as crianças denominam o local de colégio como mecanismo de protecção, tendo noção do porquê de ali estar.
            A criminalidade é outro dos factores que, actualmente, preocupa os técnicos da instituição pois acolhem jovens “pré-marginais” que têm, regularmente, atitudes de risco para com a Comunidade, sendo necessária, por vezes, a intervenção da polícia. Maria Teresa Granado defende que “o governo deve criar instituições próprias para estes jovens”.

Regresso ao passado

                Salomé e Maria (nomes fictícios), antigas residentes na Comunidade, fazem uma análise geral do tempo em que usufruíram das oportunidades prestadas pelo organismo e concluem ter sido positivo. Ambas licenciadas, alcançaram o principal objectivo de vida a que se propuseram ao integrar a Comunidade, ser “alguém na vida”. 
                Com um sorriso no rosto, Salomé explica:“A comunidade foi uma porta aberta. Foi um abrir de muitas possibilidades que eu nunca teria se estivesse integrada no meu agregado familiar.”. Destaca pontos positivos, como a noção de responsabilidade, e pontos negativos, como a solidão e falta de afectos sentida. Apesar das coisas menos boas, conclui, dizendo: “Foi uma grande escola de vida. Mudou tudo na minha vida.”.

                Amiga e companheira de casa de Salomé, Maria concorda com a ideia de que, se não tivesse ido para a instituição, não teria conseguido tirar o seu curso. Denuncia as injustiças que ocorriam na sua altura, admitindo que quanto mais injustiças via, mais vontade tinha de lutar. Num tom de segurança, exclama: “Aprende-se a viver e a conviver!”




Grupo 4 - Ana Veiga

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