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quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

“A cultura deve ser para todos e não só para quem pode”

No âmbito do Festival de Música de Coimbra, realizado de 27 de Outubro a 8 de Dezembro e que incorporou uma série de concertos desde música clássica ao Jazz, o Posts de Pescada entrevistou Augusto Mesquita, o maestro organizador do evento, com o objectivo de saber um pouco mais sobre este evento.
 
Posts de Pescada: Como surgiu a ideia de criar um evento deste género em Coimbra?
Augusto Mesquita: O Festival de Música de Coimbra começou em 1992. Foi uma iniciativa duma empresa de Lisboa que comunicou com as entidades de Coimbra. O nome inicial era Festival Internacional de Música de Coimbra e realizava-se em Julho, mantendo-se assim durante 12 anos. Normalmente os festivais surgem para que uma cidade ou região tenha um evento que divulgue a música, trazendo notoriedade, concertos, público – foi com base neste conceito que surgiu o Festival de Música e se permaneceu durante 12 anos. Depois foi anunciado à Câmara de Coimbra que o Festival não se iria realizar mais, devido a certos problemas que o levaram à falência. Mais tarde, em 2005, fui convidado pelo Presidente da Câmara para dirigir o Festival, o qual iria ser apoiado pela Universidade de Coimbra e pelo Teatro Gil Vicente. 
 
PP: Que mudanças se realizaram ao longo dos anos?
AM: No ano 2005 o Festival deixa de ser de Verão (Julho), até porque era uma altura em que os estudantes têm muitos trabalhos para a Faculdade, e passou a ser um Festival de Outono (Outubro/Novembro, tendo existido alguns prolongamentos, quando necessário), um período mais equilibrado. Também deixa de se chamar Festival Internacional de Música e passa a chamar-se, somente, Festival de Música de Coimbra, criando-se a sigla FESMUC (“FES” de festival, “M” de música e “C” de Coimbra). Passou-se, também, a dar um papel de relevo a músicos de Coimbra ou ligados à cidade, dando oportunidade a muita gente jovem. Para além disso, tornou-se o programa mais variado, no sentido de atingir diversos públicos. Por fim, uma outra é a tentativa é o alargamento do Festival por todo o distrito e não só, já chegámos a actuar em Figueiró dos Vinhos, em Viseu e Torres Novas.
 
PP: Que particularidades é que o FESMUC pode trazer a Coimbra?
AM: O aspecto mais importante de se manter, na altura de crise em que estamos, é o cultural. Coimbra tem de ter um papel importante a nível nacional e por isso ter um festival que seja digno da cidade e diferente. Não conheço nenhum festival com tanta diversidade musical e que se estenda a tantas freguesias. A cultura deve ser para todos e não só para quem pode e apesar de as salas nem sempre encherem, nota-se que quem vai aprecia bastante. Este foi dos principais objectivos que pretendi atingir com esta nova programação e a ideia do FESMUC.
 
PP: Que tipo de dificuldades sentiu ao organizar esta edição?
AM: Um corte de 50% em relação à primeira edição. É o primeiro ano em que os concertos foram todos com bilheteira, no ano transacto só os que se realizavam na biblioteca Joanina é que foram pagos. O FESMUC ainda chegou a ter patrocínios de 20/30 mil euros, de empresas, este ano não se conseguiu nenhum e a Câmara Municipal reduziu bastante as ajudas, assim como a Universidade. Também se sentiu dificuldade na contratação, há sempre muita oferta e a escolha é difícil. Ainda outro problema diz respeito à publicidade, os gastos são muito elevados e por isso teve de se reduzir, o que fez com que alguns concertos tivessem gente a menos.
 
PP: Para além da Câmara Municipal e da Universidade, quais foram os apoios do FESMUC, este ano?
AM: A Fundação INATEL que neste momento encarregou-se de alguns concertos na periferia, na Associação António Fragoso, o Conservatório de Música de Coimbra que cede o seu espaço, esquemas de cooperação com outras entidades, o TRYP Coimbra que facilita no alojamento dos músicos, o TAGV e penso que são estas, que não me esqueci de nenhuma, assim com maior importância.
 
PP:Como é que foi feita a publicidade, este ano, tendo em conta as dificuldades financeiras?
AM: Através de cartazes e flyers, os quais foram reduzidos, pois envolvem gastos gráficos e de fixação, assim como no site do FESMUC, da Câmara, também através de alguns jornais.
 
PP: Este ano é essencialmente dedicado ao piano. Alguma razão especial para esta escolha?
AM: Eu entendi que o FESMUC, devido à sua dimensão mais pequena, deveria ter um tema. Essa escolha é um pouco complicada, pois há uma variedade muito grande de possíveis temas e por isso sugeri cingirmo-nos num instrumento, sendo este ano o piano. Assim o Festival não é tão disperso e facilita-nos, visto que sofremos o tal corte de 50% das verbas.
 
PP: Que tipo de público pretende atingir?
AM: Nós queremos atingir o público mais abrangente possível, mas este ano dirigimo-nos mais aos alunos do Conservatório de Música, através da música clássica. Temos experiências muito boas do passado e por isso estou crente de que o objectivo de atingir um público generalizado vai ser possível.
 
PP: De que maneira é que o público adere à iniciativa?
AM: Parece-me que adere bastante bem e este ano senti perfeitamente isso, em todos os concertos.
 
PP: Em relação aos músicos, nota uma fácil adesão destes ao FESMUC?
AM: O FESMUC, normalmente, tem propostas que quintuplicam os concertos de músicos nacionais e estrangeiros, mas obviamente que as do estrangeiro são muito complicadas de concretizar. Depois eu também acabo por convidar um ou outro músico que conheço, ou que tenha ouvido e normalmente não tenho qualquer tipo de problema.
 
por: Maria Melo e Mónica Silva
*Este artigo não está escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico 

2 comentários:

  1. Mais um artigo de boa qualidade, pela forma como foi conduzida a entrevista, redigido e, pela divulgação.
    Quanto a mim, desconhecia a existência deste Festival e, de ora em diante poderei, também eu, ser um veiculo de divulgação.
    Estas iniciativas são sempre de louvar, mais ainda quando se trata da cultura do nosso país,
    à qual, sem dúvida,todos devem ter acesso!

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  2. Parabéns pela entrevista.Só tive pena de constatar que afinal, este ano, segundo percebi, a cultura continuou a não ser para todos mas para quem pode. Mais um motivo para louvar a existência destes projetos e, na realidade, a quem se destinam.
    Silvia Caiano

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